30 de agosto de 2013

LIVROS - NOVIDADES



Inferno e Paraíso
Peter S. Hawkins Saída de Emergência
Julho 2013
 
Sinopse
Onde acaba a realidade? Onde começa a ficção? Saiba todos os segredos da vida de Dante. O criador da obra mais épica de todos os tempos.
Durante mais de sete séculos, Dante e a sua obra-prima, “A Divina Comédia”, ocuparam uma posição especial na cultura ocidental. O poema é simultaneamente uma viagem vívida através do Inferno até alcançar o Paraíso, uma tocante história de amor e um retrato do relacionamento da humanidade com Deus. É tão ricamente imaginativo que uma primeira leitura poderá ser avassaladora. Em resposta, Peter Hawkins escreveu uma introdução inspirada ao poeta, à sua maior obra e à sua influência continuada. O seu conhecimento de Dante e o entusiasmo sentido pela sua visão tornam-no um guia exímio para o leitor interessado.
 
 
“Peter Hawkins desvenda Dante como autor e como pessoa. Não só o faz com uma erudição impecável, mas também com emoção, senso comum e empatia — tudo através de uma prosa tremendamente clara.” Matthew Pearl, autor de “O Clube de Dante”

BIBLIOTECA FICÇÃO CIENTÍFICA


BIBLIOTECA ESSENCIAL DE FICÇÃO CIENTÍFICA E FANTASIA (113)

Volume 113 — (1981) Downbellow Station
C. J. Cherryh, de nome completo Carolyn Janice Cherry, nasceu em 1942 em St Louis nos EUA. Começou por publicar em 1976 “Gate of Ivrel”, que obteve certo sucesso, consagrando-se como contista em 1979, ao ser-lhe atribuído um Prémio Hugo prelo conto “Cassandra”. Recebe um outro Hugo em 1982, um tanto imprevistamente, pelo romance “Downbellow Station”. Obra considerada medíocre pela crítica, não deixa de ser um desafio para o leitor. O romance “Cyteen” é distinguido com os Prémios Locus e Hugo em 1989.
Actualmente C. J. Cherryh é uma das mais célebres escritoras de Ficção Cientifica e conta com mais e 40 títulos publicados.
Downbellow Station: Downbellow é um planeta habitado por seres nativos comparados com os macacos inteligentes e simpáticos, os hisa. A estação espacial é Pell, objecto de disputa entre duas famílias terrestres. É uma história hábil, cheia de intrigas e estratégias, num clima de tensão.
 
 

11 de agosto de 2013

RECORDAÇÕES HOLMESIANAS

 
RECORDAÇÕES HOLMESIANAS (6 - 3ª PARTE)
PASTICHE / PARÓDIA —  A AVENTURA DO ESCONDERIJO DE PARADOL
“The Adventure of the Paradol Chamber” é uma pequena peça teatral do famoso escritor John Dickson Carr, incluída na Ellery Queen Anthology, de 1942, “The Misadventures of Sherlock Holmes”, foi representada pela primeira vez em 1949, no encontro anual dos Mystery Writers of America.
Tradução e organização de M. Constantino.
A cena representa a sala de estar de Sherlock Holmes em Baker Street, 221B. Distinguem-se na penumbra dois vultos e o som leve de um violino. Acima de qualquer ruído, o narrador desconhecido procede à leitura:
“Encontro escrito no meu caderno de notas que o caso ocorreu numa tarde do mês de Agosto do ano de 1887. Durante todo o dia, Sherlock Holmes havia estado distraído e de mau humor. Ao entardecer, agarrou o violino e, sentando-se na sua poltrona, com os olhos cerrados, arranhou suavemente as cordas do instrumento. Os sons, ora suaves, ora profundos e melancólicos, cortavam o silêncio”.
As luzes acendem-se, lentamente… Holmes e Watson estão sentados em lugares opostos da sala. O violino termina num suave sussurro. Watson — em êxtase — deixa cair o Daily Telegraph para o chão.
Watson — Caro Holmes, o seu virtuosismo não tem rival. Queira continuar, por favor!
Holmes — Não estou de humor para isto, Watson (põe o violino sobre a mesa e levanta-se). A minha mente está demasiado torturada com esta obsessão.
Watson (divertido) — Não pode ser. Outra vez? È por virtude do Professor Moriarty?
Holmes — È o Napoleão do Crime, Watson Atrevo-me a apostar qualquer coisa, em que encontrará nesse mesmo jornal, que é o primeiro que os seus olhos alcançam.
Watson — Por Deus, Holmes! (pegando no jornal). Está aqui algo curioso!
Holmes — Rápido, Watson, leia!
Watson (lendo) — “Lord Matchlock, Ministro dos Negócios Estrangeiros, teve um colapso quando se dirigia a Constitution Hill, depois de abandonar o Palácio de Buckingham. Não obstante notícias de última hora afirmam que o seu estado é satisfatório.”
Holmes — Maravilhoso!
Watson (continuando a ler) — “os senhores Lestrade e Gregson, da Scotland Yard, difundiram uma estranha notícia. Lord Matchlock num dia de calor intenso, levava um grosso casaco de lã, colete e gravata Ascot, uma grossa camisa de lã e botas Hassan, por isso…” (reagindo à notícia) Caro Holmes, que mal há nisso?
Holmes — É uma velhaquice!
Watson — Holmes, encontra alguma coisa de estranho?
Holmes — Não levava calças, Watson, Lord Matchlock não levava calças!
Watson (parecendo embaraçado) — Mas isso é maravilhoso, Holmes?
Holmes — Elementar, meu caro Watson! Mas não a falta de sentido; naturalmente a Scotland Yard nunca vê nada.
Watson — Porém, porque ia Lord Matchlock, Ministro dos Negócios Estrangeiros sem calças?
Holmes (escutando passos) — Aí vem, creio, a chave do nosso problema!
(ouve-se bater à porta)
Watson — Um cliente, Holmes…
Holmes — Talvez traga resposta à nossa interrogação.
(Watson abre a porta e entra Lady Imogene Ferrers num estado de terror mal contido. Traz um embrulho médio em papel de jornal, olha para um e para outro dos homens, finalmente decide-se…)
Imogene — O senhor é Sherlock Holmes?
Holmes (tranquilizante) — Acalme-se, por favor, minha senhora. Watson, uma cadeira para a senhora. (Watson aproxima-se com a cadeira) — uma chávena de chá não lhe fará mal de todo. Parece-me nervosa.
Imogene — É o medo senhor Holmes. É o terror. Eu sou Lady Imogene Ferrers. O meu pai, Lord Matchlock, Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Watson (com raiva aparente) — Roubaram as calças ao seu pai?
Imogene — Os senhores devem ser adivinhos! Vim aqui, senhor Holmes, para lhe entregar isto (passa a Holmes um par de calças contidos no embrulho)
Watson — Céus! Um par de calças!
Holmes — São estas as calças do seu pai?
Imogene — Não, senhor Holmes. Não! Até este momento não tinha a menor ideia que o meu pai andasse sem calças.
Holmes — Então como chegaram estas à sua posse?
Imogene — Esta manhã, senhor Holmes, atiraram um par, esse par de calças, por uma janela superior do Palácio Buckingham. Vi-as cair…
Watson — Holmes, Algum demónio que se dedica a roubar as calças no meio de Londres!
Holmes — Bem, Watson, não estou convencido de todo. Posso confirmar o que é evidente? (examina as calças com a lupa, depois dirige-se a Lady Imogene) — Palácio Buckingham, foi o que disse, não é verdade?
Imogene — Sim senhor Holmes. O meu pai foi lá para uma conferência com o novo embaixador francês, Monsieur Paradol, e sua Majestade, a rainha, creio. Acredito que se trata de um pacto secreto entre a França e a Grã-Bretanha. Pode imaginar a minha angústia, o meu terror, quando vi as calças voarem pela janela de sua majestade!
(Ouve-se um ruído lá fora)
Holmes — Rápido, Watson! Esconda a prova! (entrega as calças a Watson, que as esconde entre a casaca e a camisa, depois dirige-se para a porta)
Watson — Este não é um cliente corrente, Holmes.
Holmes — Fale claro, por favor!
Watson (abrindo a porta e curvando-se como um criado — Sua Excelência o Marquês de Paradol!
(Entra o Marquês de Paradol, de chapéu alto e casaco tipo imperial, olha para cada um e tira o chapéu)
Paradol — Senhores! Senhora! (curva-se)
Imogene (gritando) — O senhor veio aqui para clarificar o tremendo enigma do Palácio Buckingham?
Paradol (com feroz dignidade) — Vim aqui, senhora, para recuperar as minhas calças!
Holmes — Devemos entender que também as calças de sua excelência desapareceram?
Paradol — Não, não desapareceram. No Palácio Buckingham, na presença de sua Majestade, a rainha, roubaram-me as calças e atiraram-nas pela janela.
 
Watson — Não é possível!
Paradol — Sim, é certo. Tudo sucedeu num momento. Vi através de um espelho, seis homens mascarados e com barbas postiças, dirigirem-se para mim, ameaçadores. Cumpri o meu dever! Gritei “Viva a França” e fiquei sem calças!
Imogene — O senhor fez isso na presença de sua Majestade?
Paradol — Sinto muito. Ela lançou um grito tremendo e desmaiou sobre o sofá dourado. Devo pedir-lhe perdão, minha senhora!
Imogene — Não tem de pedir perdão por nada.
Paradol — Tenho de pedir-lhe perdão por haver tirado as calças a de seu pai! Eram de vital importância para a minha vida. Veja, senhora, tinha de vestir umas calças para poder sair.
Watson — Oh! Pioraram os serviços diplomáticos… porém, por que queriam esses miseráveis roubar-lhe as calças?         
Paradol — O senhor já ouviu falar do tratado Paradol— Matchlock entre Inglaterra e França?
Imogene — O tratado secreto, creio.
Holmes — O tratado secreto, segundo presumo, estava nas calças de Sua Excelência
Paradol (admirado) — Que homem! Que homem magnífico! Que dedução!
Holmes (retirando as calças escondidas em Watson) — Um esconderijo secreto de finíssimas lâminas de cobre ocultavam o tratado, que devolvo a Sua Excelência. (faz uma vénia).
Paradol (pegando nas calças) — Senhor! Em nome do meu governo, em meu nome e da França inteira eu … (detém-se e começa a examinar as calças nervosamente)
Imogene — Está nervoso, senhor Paradol? Será que não encontra o esconderijo secreto?
Paradol — O esconderijo, sim, mas o tratado desapareceu!
Imogene — Desapareceu?
Watson — Desapareceu?
Holmes — não tenha dúvidas, meu caro senhor. O tratado está nesta casa. Foi substituído por um ladrão e traidor!
Watson — Trata-se de Moriarty?
Holmes — Não se trata de Moriarty, não senhor. Trata-se do seu lugar-tenente o segundo homem mais perigoso de Londres… Está aqui! (arranca o bigode a Watson, que fica estupefacto).
Imogene — Então não é o senhor Watson?
Holmes — Não Lady Imogene, o verdadeiro Watson deve estar amarrado e amordaçado. Apresento-lhe o coronel Sebastian Moran.
O falso Watson — Maldito Holmes! Devia acabar consigo com uma bala!
Paradol — Mas como conseguiu suspeitar deste miserável?
Holmes — De uma maneira muito simples. Quando Sua excelência entrou e nomeou um facto que não era do conhecimento público, dei-me conta da classe de homem que me acompanhava e dei-lhe uma oportunidade para roubar o tratado. (Procura na roupa interior do falso Watson e recolhe, com expressão de triunfo, um documento que entregou a Paradol.
Paradol — A aventura do esconderijo de Paradol.
O falso Watson — Não, maldita seja “a aventura das calças de cobre”!
CAI O PANO

10 de agosto de 2013

RECORDAÇÕES HOLMESIANAS


RECORDAÇÕES HOLMESIANAS (6 - 2ª PARTE - CONCLUSÃO)
PASTICHE / PARÓDIA — O INTÉRPRETE GREGO
(CONCLUSÃO)
 
Um conto de Sir Arthur Conan Doyle reescrito por W. S. Baring-Gould, autor de Sherlock Holmes of Baker Street, numa versão de M. Constantino.
 
 
 
Sherlock olhou para o irmão e perguntou:
— Algumas pistas? Mycroft pegou no Daily News que estava em cima da mesa ao lado.
“Quem puder fornecer informações sobre o paradeiro de um cavalheiro grego de nome Paul Karatidesuú, de Atenas, que não sabe falar inglês, será recompensado” — leu — Uma recompensa semelhante será extensível a quem nos puder informar acerca de uma senhora chamada Sophy X 2473”. Pus isto em todos os jornais diários mas ninguém respondeu.
Vais investigar este caso, Sherlock?
— Com certeza — disse Sherlock Holmes, levantando-se da cadeira. — Entretanto, Sr. Melas, no seu lugar, manter-me-ia alerta porque eles devem saber, por estes anúncios, que o senhor os denunciou.
De volta à Baker Street, Holmes subiu as escadas e, quando abriu a porta da sala, ficou surpreendido. Olhei por cima do seu ombro, também eu fiquei surpreso Mycroft Holmes estava a fumar, sentado num cadeirão.
— Entra Sherlock! Entre Sr. Watson! — exclamou — Não esperavas tanta energia da minha parte, pois não Sherlock? Mas, não sei porquê, este caso atrai-me particularmente.
— Como é que chegaste aqui?
— Passei por vocês num cabriolé.
— Houve mais alguma novidade?
— Mal tinham saído quando recebi uma resposta ao meu anúncio.
— E em que consiste?
Mycroft tirou do bolso uma folha de papel.
— Vejam vocês mesmos. Aqui está, escrito com uma caneta de aparo em papel real de cor creme…
— … por um homem de meia-idade…
— … com uma constituição frágil. “Caro Senhor — diz ele — em resposta ao seu anúncio de hoje, permita-me informá-lo que conheço muito bem a jovem senhora a que se refere. Se tiver oportunidade de me vir ver, poder-lhe-ei dar algumas informações relacionadas com a sua triste história, Está a viver, presentemente, numa casa chamada The Myrtles, em Beckenham. Atenciosamente, J. Davenport”. Ele escreve de Lower Brixton. Não achas, Sherlock, que poderíamos ir até lá agora e ficar a saber mais pormenores?
— Meu caro Mycroft, a vida do irmão é mais importante do que a história da irmã. Creio que deveríamos entrar em contacto com o inspector Gregson da Scotland Yard e irmos directamente para Beckenham.
— E melhor irmos buscar, de caminho, o Sr. Melas — sugeriu Watson. — Poderemos precisar de um intérprete.
— Óptimo, Watson! — disse Sherlock Holmes. — O rapaz que vá à procura de um fiacre e sairemos já. — Abriu então a gaveta da mesa enquanto falava, e Watson reparou que tinha retirado não a pistola especial, que ele usava para a prática de tiro ao alvo, mas um Webley.  — Sim, — disse em resposta ao olhar de Watson. — De acordo com tudo o que ouvi, acredito que estamos a lidar com um bando particularmente perigoso.
Tinha quase escurecido quando chegámos à Pall Mall e aos aposentos do Sr. Melas. Contudo, um cavalheiro tinha necessitado dos seus serviços e ele acabara de sair.
— Pode dizer-me para onde? — perguntou Mycroft Holmes à senhoria.
— Não faço ideia, caro senhor. Só sei que ele seguiu com esse tal cavalheiro numa carruagem.
— Vamos, Mycroft! — gritou Sherlock Holmes, abruptamente. — O caso está a tornar-se sério!
Passou-se mais de uma hora até que pudessem falar com o inspector Gregson para resolverem as formalidades legais que lhes permitissem entrar na casa. Era um quarto para as dez quando chegaram à London Bridge, e dez e meia quando desceram até à plataforma do comboio para Beckenham. Com Sherlock Holmes ainda furioso devido às formalidades, viajaram durante meia hora até The Myrtles, uma enorme casa sombria, desviada da estrada, no interior de uma propriedade. 
 Os nossos pássaros levantaram voo e o ninho já está vazio — resmungou Sherlock Holmes para Gregson.
— Porque diz isso?
— Olhe para o chão da entrada, Gregson. Uma carruagem carregada de bagagens passou por aqui nem há uma hora.
— Eu vejo as marcas das rodas à luz do candeeiro que está junto ao portão — concordou Gregson. — Mas como é que o senhor descobriu que havia bagagem?
— Deveria ter observado as mesmas marcas de rodas dirigindo-se em sentido contrário — explicou Mycroft Holmes. — Estas eram muito mais profundas. De tal modo que poderemos dizer com toda a certeza que havia bastante peso na carruagem.
— O seu raciocínio ultrapassa-me um pouco — disse o inspector, encolhendo os ombros. Bateu com força na aldraba e puxou pela sineta, mas sem obter qualquer resposta. Holmes tinha desaparecido, mas voltou logo daí a alguns minutos.
— Consegui abrir uma janela disse ele.
— Felizmente, Sr. Holmes, está do lado da lei e não contra ela —  observou Gregson, ao reparar na maneira hábil com que o detetive forçara o fecho. — Bem, parece-me que, dadas as circunstâncias, poderemos muito bem entrar.
Um após outro, lá entraram todos na enorme divisão, com alguma dificuldade para a corpulência de Mycroft. Silenciaram. Um gemido muito abafado vinha algures do andar de cima. Holmes. Apressou-se a subir as escadas com Watson e Gregson atrás dele, enquanto Mycroft os seguia, tão rápido quanto o seu corpo volumoso lhe permitia.
Viram-se diante de três portas no primeiro andar, e era da porta central que esses ruídos sinistros pareciam emanar. A porta estava trancada mas a chave estava no lado de fora. Holmes abriu a porta de par em par e precipitou-se para o interior da divisão, mas saiu logo em seguida com as mãos na garganta.
— É carvão! — gritou ele. Esperem até o fumo se ter dissipado mais.
Ao olharem para dentro puderam vislumbrar duas figuras agachadas junto a parede. Apressadamente pegaram nos homens intoxicados e arrastaram-nos até ao patamar. Um era o intérprete grego, o outro um jovem alto no último estado de fraqueza. Um olhar foi suficiente para revelar a Watson que, para o homem alto, a ajuda chegara tarde de mais. O Sr. Melas, no entanto, ainda estava vivo e, em menos de uma hora, com a ajuda de brandy e amoníaco, tiveram a satisfação de o ver abrir os olhos.
Ao comunicar com o cavalheiro que respondera ao anúncio de Mycroft Holmes, Sherlock em breve veio a saber que a infeliz jovem senhora provinha de uma família grega muito rica. De visita a uns amigos em Inglaterra, conhecera um jovem chamado Harold Latimer, que, aparentemente, a persuadira a fugir com ele. Os amigos dela, chocados informaram o irmão que Sophy tinha em Atenas. Imprudentemente, ao chegar a Inglaterra, o irmão acabara por ficar à mercê de Latimer e do seu associado, cujo nome era Wilson Kemp, um homem com antecedentes criminosos. Estes dois tinham-no mantido prisioneiro, e tinham tentado através de certas crueldades e da fome, que ele lhes legasse a propriedade. Tinham-no mantido nessa casa sem que a rapariga soubesse de nada, e com ligaduras de gesso no rosto, para evitar que ela o reconhecesse, se por acaso o visse.
Meses mais tarde, um curioso recorte de jornal chegou ate Holmes, vindo de Budapeste. Relatava como dois ingleses, que viajavam com uma mulher, tinham encontrado um fim trágico. Tinham sido esfaqueados, e a Policia húngara era da opinião que tinham discutido um com o outro e se tinham esfaqueado mutuamente.
Sherlock Holmes, no entanto, tinha uma opinião diferente.
— Se alguém conseguisse encontrar essa rapariga grega… — dissera ele a Watson. — Talvez pudéssemos saber de que modo alguém se poderia ter vingado de todos os prejuízos, causados a ela e ao irmão. E como seria que Wilson Kemp se associou a Latimer? Creio que por detrás de todos esses crimes existe uma outra mão.
— A do Professor James Moriarty? — perguntou Watson com voz baixa. — A do próprio Napoleão do crime Watson — disse Holmes, acenando afirmativamente com a cabeça. — Mas já o disse antes e volto a dizê-lo.
O nosso dia irá chegar!

 

 

9 de agosto de 2013

RECORDAÇÕES HOLMESIANAS

RECORDAÇÕES HOLMESIANAS (6 - 2ª PARTE)

PASTICHE / PARÓDIA — O INTÉRPRETE GREGO
 
Um conto de Sir Arthur Conan Doyle reescrito por W. S. Baring-Gould, autor de Sherlock Holmes of Baker Street, numa versão de M. Constantino.

 
Após tomarmos chá, numa quarta-feira, 12 de Setembro, a nossa conversação, segundo Watson, desenvolveu-se de um modo vago e irregular, alternando desde tacos de golfe às causas da mudança na obliquidade da circunferência celeste, desembocou finalmente na questão do atavismo e das tendências hereditárias.
— No seu caso — disse Watson a Holmes — é óbvio que a sua capacidade de observação e a faculdade para a dedução se devem à qualidade sistemática do modo como foi educado.
— Até certo ponto...— comentou Holmes, pensativamente. — Mas apesar de tudo, o facto de me ter tornado assim corre-me nas veias.
— E como sabe que é algo de hereditário?
— Porque o meu irmão Mycroft é muito melhor do que eu nesse aspecto.
Estas revelações eram novidade para Watson. Se houvesse um outro homem com poderes tão singulares em Inglaterra, como se justificaria que nem a Polícia nem o público tivessem ouvido falar dele?
— Ah. ele é muito conhecido no seu círculo — disse Holmes.
— Mas onde?
— No  Diogenes Club, por exemplo. Trata-se do clube mais exclusivo de Londres, Watson, e o Mycroft é também um dos homens mais extravagantes.

— Ele está sempre lá, desde um quarto para as cinco às vinte para as oito.
Agora são seis horas, de modo que se quiser dar um passeio neste admirável fim de tarde, terei todo o gosto em apresentar-lhe duas curiosidades.
Cinco minutos depois já estavam na rua, a caminhar em direção a Regent Circus.
— Deve estar a pensar — disse Holmes — por que motivo Mycroft não usa os seus poderes para se tornar num óptimo detetive. Mas ele seria incapaz de uma coisa dessas.
— Mas acabou de dizer…
— Disse que ele me superava em observação e dedução. Se a arte ou habilidade de um detetive consistisse apenas em raciocinar sentado numa cadeira de braços, o meu irmão seria o melhor detective que o mundo já conheceu. Mas não tem nem essa ambição nem a energia para tal. Mycroft nem sequer se dá ao trabalho de verificar as suas soluções, prefere que considerem que possa estar errado em vez de provar que Tem razão. Já fui muitas vezes ter com ele para resolver um problema e recebi sempre uma explicação que, mais tarde, verifiquei estar correcta. Ele seria absolutamente incapaz de revolver as questões de ordem prática, que devem ficar claras antes de um caso poder ser apresentado a um juiz ou a um júri.
— Vejo que ser detetive não é a profissão dele.
— Nem por sombras. Tem uma enorme aptidão para os números e audita certas pastas num departamento do governo. Mycroft está hospedado na Pall Mall e, todas as manhãs, dobra a esquina até White Hall, regressando todas as tardes do mesmo modo. Durante todo o ano não faz outro exercício e não é visto em mais nenhum lugar, excepto no Diogenes Club que fica justamente em frente dos seus aposentos.
Tinham chegado à Pall Mall enquanto conversavam e começaram a descer. Holmes parou diante de uma porta, a pouca distância do Carlton e conduziu Watson até ao vestíbulo. Através dos painéis de vidro, este vislumbrou uma sala ampla e luxuosa, na qual um número considerável de homens estava sentado a ler jornais, cada um no seu próprio canto. Holmes entrou com o médico numa pequena sala que dava para a Pail Mall Street.
— “Sala dos Visitantes” — disse Holmes. — É o único lugar no Diogenes Club onde se pode conversar. Por favor, desculpe-me por momentos.
Breve voltou com um outro indivíduo que Watson viu logo que só poderia ser o seu irmão.
Mycroft Holmes era um homem de maior estatura e mais forte do que Sherlock. O corpo era em tudo volumoso mas o seu rosto, ainda que neutro, tinha preservado qualquer coisa da intensidade expressiva que era tão evidente no irmão. Os olhos de um cinzento-pálido muito particular pareciam sempre reter algo de distante e introspetivo que Watson apenas observara em Sherlock quando este estava na posse de todos os seus poderes intelectuais.
— Tenho muito gosto em conhecê-lo —   disse Mycroft Holmes estendendo uma manápula aberta como se se tratasse de uma barbatana de foca.
— Oiço falar em Sherlock por todo o lado desde que o senhor começou a fazer as crónicas dos seus casos. A propósito, Sherlock, esperava ver-te na semana passada para me consultares acerca do caso de Manor House. Foi o Adams, está mesmo a ver-se…
— Sim, foi o Adams.
— Estava seguro disso desde o princípio. — Sentaram-se os dois junto de uma janela do clube. — Para qualquer pessoa que deseje estudar a humanidade, este é o melhor posto de observação — comentou Mycroft.
— Por exemplo, nestes dois homens que estão a caminhar na nossa direção, vêm para aqui.
— O marcador de bilhar e o outro?
— Precisamente, o que pensas do outro?
— Um velho soldado, estou a ver — disse Sherlock.
— E desmobilizado recentemente — notou o irmão.
— Vejo que esteve em serviço na Índia.
— E como sargento.
— Na Artilharia Real, suponho.
— É viúvo.
— Mas com um filho.
— Dois, no mínimo, meu rapaz!
Mycroft, sorrindo, retirou uma pitada de rapé de uma caixinha de tartaruga, e sacudiu a parte que lhe tinha caído no casaco com um grande lenço de seda.
— A propósito, Sherlock — disse ele — soube de algo que te deverá interessar bastante, um problema assaz invulgar, sobre o qual me pediram uma opinião. Não tive a energia suficiente para o investigar, a não ser de um modo muito superficial, mas serviu-me de base para algumas especulações que muito me agradaram. Se estiveres interessado em ouvir os factos…
— Decerto, meu caro Mycroft, encantar-me-ia. O irmão escrevinhou uma nota numa página do seu livrinho de apontamentos, e, depois de ter tocado a campainha, entregou-a ao criado.
— Pedi ao Sr. Melas para vir até aqui — disse ele. — Esse senhor está hospedado num andar por cima do meu. O Sr. Melas é de origem grega e ganha a vida como guia para os orientais endinheirados. Mas ele contará à sua maneira a aventura extraordinária em que se meteu.
Alguns minutos depois, juntou-se a nós um homem baixo e bem constituído com um rosto cor de azeitona e o cabelo muito negro. Apertou a mão a Sherlock Holmes, e os seus olhos escuros brilharam de prazer logo que percebeu que aquele especialista estava ansioso por ouvir a sua história.
— Hoje é quarta-feira — começou o Sr. Melas. — Bem, na noite de segunda-feira, só há dois dias, está a ver… que um tal Sr. Latimer subiu até aos meus aposentos para me pedir que o acompanhasse numa carruagem. Seguimos o percurso por cerca de duas horas sem que tivesse a mínima ideia do local para onde nos dirigíamos. Eram sete e um quarto quando saímos da Pall Mall. O meu relógio indicava dez minutos para as nove quando finalmente a carruagem parou. Consegui vislumbrar uma porta baixa, e em arco, por cima da qual havia uma lanterna acesa. Enquanto me empurravam para fora da carruagem, reparei que a mesma era aberta por um homem de meia-idade, de aspecto desagradável. Conduziu-me até uma sala que me pareceu estar ricamente mobilada. O Sr. Latimer já nos tinha deixado, mas voltou, conduzindo um homem vestido com um roupão muito largo e terrivelmente pálido. Porém, o que mais me chocou foi o facto de o seu rosto estar grotescamente coberto por ligaduras de gesso e de ter uma mordaça na boca. “Tens a lousa, Harold?” gritou o mais velho para o Sr. Latimer. “Desamarraram-lhe as mãos? Bem, então deem-lhe um lápis. Deverá fazer as perguntas, Sr. Melas, e este homem irá escrever as respostas. Pergunte-lhe, antes de mais, se está preparado para assinar os papéis”. “Nunca!” escreveu o homem pálido em grego nessa lousa.
“Sem quaisquer condições?” — perguntei-lhe, instigado pelo homem de idade.
“Só se a vir casada na minha presença por um padre grego que eu conheça.”
— Em breve tive uma óptima ideia — continuou o Sr. Melas. Comecei a acrescentar pequenas frases minhas após cada pergunta, de modo que a nossa conversa desenrolou mais ou menos deste modo:
“Não ganhará nada com essa teimosia. Quem é?
“Não me importa. Sou um estranho em Londres.”
“O seu destino depende de si. Há quanto tempo cá está?
“Deixá-lo. Três semanas.”
“A propriedade nunca poderá vir a ser sua. Que o apoquenta?
“Não irá para malfeitores. Estão a matar-me à fome.
“Será libertado se assinar. Que casa é esta?
“Nunca assinarei. Não sei.”
“Não a está a ajudar. Como se chama?
“Ela que o diga. Karatides.”
“Se assinar pode vê-la. De onde é?
“Então nunca a verei. De Atenas.”
Nesse momento a porta abriu-se e uma mulher entrou na sala. “Harold!” exclamou ela em inglês, com um sotaque muito cerrado. “Não pude ficar por mais tempo. Senti-me tão sozinha lá em cima só com… Oh, meu Deus, é o Paul!” Estas últimas palavras disse-as ela em grego e, na mesma altura, o homem, com um esforço convulsivo, conseguiu retirar a mordaça engessada da boca e gritou: “Sophy! Sophy!”
O mais novo agarrou na mulher e empurrou-a para fora da sala, enquanto o mais velho dominou com facilidade a vítima debilitada, arrastando-a pela outra porta. O homem mais velho voltou.
— Estão aqui cinco libras em ouro — disse-me — que, segundo espero, serão pagamento suficiente. Mas se falar nisto a então que Deus tenha piedade da sua alma!
Quase me arrastaram até ao veículo. O Sr. Latimer seguia de perto os meus passos e sentou-se no assento à frente sem dizer palavra. Percorremos em silêncio uma distância que nunca mais acabava, com as janelas fechadas, até que a carruagem parou e empurraram-me para fora. Estava em Wandsworth Common. Andei cerca de dois quilómetros até Clapham Juntion, apanhei um comboio para a cidade. Foi esse o fim da minha aventura, Sr. Holmes. Contei tudo em detalhe ao Sr. Mycroft, na manhã seguinte, e, mais tarde, à Polícia.
(CONTINUA)
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