13 de julho de 2012

CALEIDOSCÓPIO 195

EFEMÉRIDES – Dia 13 de Julho
Brad Parks (1974)
Nasce em New Jersey, EUA. Jornalista e repórter profissional, começa a escrever ficção aos 26 anos. Em 2009 publica o seu primeiro livro, Faces Of The Gone, um romance inspirado num quádruplo homicídio ocorrido em 2004 em Newark que o autor investigou como jornalista. Em 2010 o livro recebe o Nero Award para o melhor romance de mistério americano e o Shamus Award para Best First Novel — é a primeira vez que um livro é distinguido com os dois galardões em simultâneo. Com este livro Brad Parks cria Carter Ross, um repórter/investigador que escreve sobre crime para um jornal inexistente The Newark Eagle-Examiner e é já protagonista de mais 2 livros Eyes of the Innocent (2011) e The Girl Next Door (Março 2012).
 


TEMA — SUPERSTIÇÕES — DIA 13 SEXTA-FEIRA
Conto de Hélia
Olhara maquinalmente o calendário e lera: — Dia 13, sexta-feira. Um arrepio percorreu-me o corpo. Não era supersticiosa mas desde que me levantara que notava que qualquer coisa me iria acontecer.
Tratei de me distrair pondo uns discos bastante trepidantes enquanto ia ensaiando uns novos passos que meu irmão me ensinara. A minha gata olhava-me complacente.
Eu estava sozinha na enorme casa de campo pois fora para lá a fim de estudar para o exame.
Olhei o relógio: — 18 horas.
— Uhm! Já tinha um certo apetite.
Fui à cozinha arranjar uma sanduíche quando ouvi a gata miar.
Estranhei e voltei atrás.
O bicho: estava no meio da saia, completamente ouriçado e de olhos esbugalhados, fitando qualquer coisa que eu não enxergava.
Fiquei como que paralisada. A gata continuava a uivar baixinho eu tentando vencer o terror que se apoderara de mim, avancei. Olhei para todos os lados e nada vi. Serenei um pouco e fui fazer uma testa a bichana. No entanto a sensação de que não me encontrava sozinha, acentuava-se.
Abri os cortinados e escancarei a janela. Só nesse momento e que reparei que um; nevoeiro cerradíssimo caíra sobre o campo.
Senti-me indefesa e terrivelmente só. O disco parara e o silêncio era absoluto. Muito ao longe um cão uivou. Olhei o calendário: — 13, sexta-feira. De súbito ouvi uma porta ranger. Abafei um grito. Corri rapidamente para a secretária cuja gaveta abri. O pequeno revólver que meu irmão me oferecera tinha desaparecido. Senti a garganta contrair-se de angústia. Tentei acalmar. Porém continuei no mesmo sítio, sem conseguir mover-me.
Soaram passos cautelosos e depois a porta começou a abrir-se lentamente, muito lentamente, até que num repelão foi toda aberta.
A gata soltou um lamentoso miau e correu a esconder-se.
Começou a recuar vagarosamente como que hipnotizada. O retinir agudo e irritante do telefone fez-se ouvir. Estremeci como ao acordar de um pesadelo e aproveitando a hesitação do homem, corri para a janela que transpus, de um salto, caindo na fofa relva.
Levantei-me ofegante e comecei a correr desvairada.
Parei um momento e ouvi uma respiração muito perto e os passos abafados do meu perseguidor. Comecei a correr novamente, porem mais devagar porque me sentia desfalecer. Uma dor muito fina fez-me cambalear. “Oh, aquela maldita distensão no pé estava a fazer das suas!”
Forcei a marcha, percebendo que continuava a ser seguida. Ao passar junto a uma árvore esbarrei numa teia de aranha que se pegou ao meu rosto. Soltei um grito de susto e nojo.
Ia perdendo terreno e agora novo perigo me ameaçava. Com aquele nevoeiro tinha-me desorientado completamente e eu sabia da existência de um precipício perto a minha casa e muito justamente chamado “Abismo do Diabo”.
Nova dor no pé fez-me ajoelhar com lágrimas nos olhos. Levantei-me mas torneia a cair com um gemido. Julgando ser o meu último segundo de vida, soltei um angustioso grito, tentando ser ouvida por alguém Uns segundos de silêncio e uma gargalhada sinistra corta o nevoeiro seguida de uma voz falsamente lamentosa:
— Pobrezinha, caiu no abismo!
E nova gargalhada soou.
Continuei estendida na erva húmida ouvindo apenas o galopar louco do meu coração.
Estendi um braço e só encontrei o vácuo.
Senti uma vertigem. Caíra no momento preciso. Se tivesse dado mais um passo o “Abismo do Diabo” teria feito nova vítima.~
Regressei a casa muito tempo depois; e encontrei-a cheia de gente, meus pais, meu irmão e alguns amigos que ficaram verdadeiramente alarmados com o meu aspecto lamentoso.
Depois de toda a história contada entre olhares aterrorizados, meu pai decidiu telefonar à Polícia.

Só me resta agora acrescentar na calma obscuridade do meu quarto que dias mais tarde o meu atacante foi apanhado, tentando estrangular uma indefesa rapariguita.
Agora esse louco sanguinário encontra-se num presídio longe de tudo e de todos.
E eis porque não sendo supersticiosa, não consigo dominar um estranho arrepio cada vez que leio no calendário — “DIA 13, SEXTA-FEIRA”.

TEMA — DIA 13 SEXTA-FEIRA
Por M. Constantino
A ideia de relacionar a sexta-feira 13 ao tenebroso e ao sobrenatural é muito antiga no mundo ocidental. É na sexta-feira que se comemora a ressurreição de Jesus Cristo, aquele que na última ceia juntou à mesa 13 pessoas. Assim o número 13 passou a ser um número de mau presságio, de perigo, de fatalidade com uma sombra de mistério.
Muita gente leva a sério este dia ou coincidência, de sexta-feira 13, privando de determinados actos, sempre que este se verifica. Simples superstição, porquanto no oriente é precisamente o contrário. Treze é um número venerado: 13 estátuas de Buda na Índia, 13 é um número sagrado na China e no Japão o símbolo da sorte. Também no México Antigo os deuses eram 13. Em Portugal a face boa para o dia 13 está relacionada com as aparições de Fátima.




TEMA — QUANDO A JUSTIÇA ERRA — O CRIME DA CALÇADA DE ATAMARMA
De M. Constantino
Cerca das 5 horas da madrugada do dia 13 de Julho de 1811, o Dr. Francisco Mata, com um seu criado, ao passarem pela Calçada da Atamarma, cidade de Santarém, depararam com um indivíduo morto, numa poça de sangue. Não foi difícil depreender que o homem tinha sido vítima de um crime, pois tinha a cabeça esmagada por um tiro de bacamarte.
Comunicado o acontecimento às autoridades, foi averiguado que se tratava de José Vasconcelos, proprietário, pai de oito filhos, residente no Cartaxo. Se não havia dúvidas quanto à evidência do crime, já o mesmo não acontecia quanto ao móbil, uma vez excluída a hipótese de roubo, já que lhe foram encontrados nos bolsos diversos objectos de valor e vinte e seis mil réis em moedas de ouro. A quem aproveitava o crime. Obviamente aos herdeiros, porém provou-se nada ter a ver com o assunto. A hipótese de vingança era de considerar. Alguém falou que um caseiro fora despedido por falta de pagamento de renda. Procurou-se o homem. O juiz instrutor acompanhado por oficiais de justiça correu para Tapada, aldeia do concelho de Almeirim, situada logo à saída da ponte D. Luís, onde residia o alegado caseiro, António Pinto, com a mulher e cinca filhos menores. Na busca foi encontrado um velho bacamarte e umas calças velhas com nódoas vermelhas. Tanto bastou para lhe darem voz de prisão, apesar do pobre homem clamar a sua inocência e declarar que as nódoas eram de tinta, pois era pintor de profissão. De nada lhe valeram os protestos e juras. Cautelosamente amarrado foi levado para Santarém, onde o aguardavam centenas de pessoas aos gritos de “assassino”, “morre”, “mata”, comentava-se a eficácia a justiça.
Dois meses após o assassínio efectuou-se o julgamento. Não havia nada contra o réu senão provas circunstanciais e este continuava a afirmar a sua inculpabilidade, mas o magistrado tinha de defender a sua reputação e dar satisfação à opinião pública, não hesitou em aplicar a pena máxima, confirmada no recurso para o Supremo Tribunal. O pintor da Tapada foi enforcado.
Anos mais tarde, após a revolução de 1820, foi verificada a sua inocência. Com efeito, um recluso de nome Gil Martins, por alcunha o “Baleia”, devido à sua corpulência, que cumpria pena de prisão em Tavira por furto e que sentindo a morte, fez uma confissão completa e detalhada sobre o crime da Atamarma, revelando ser ele e Miguel Osório, piloto do barco capitaneado pelo velho Capitão Aguiar os autores do crime, um crime por engano. Este Miguel Osório, ambicioso e detestável individuo com uma história tenebrosa, ao ser-lhe apresentada a filha do Capitão Aguiar, Maria das Dores, herdeira de uma fortuna acentuada, logo por ele cobiçada, apesar de noiva de um jovem médico — Constantino Aguiar — criado pelo capitão e residente em Santarém. Nas vésperas do casamento Osório com o “Baleia” dirigiram-se a Santarém, armando uma cilada ao médico que afinal resultou na morte do homem do Cartaxo, porquanto o Dr. Constantino de Aguiar se deslocara à capital para tratar assuntos do casamento, salvando assim a vida.
Quando Osório regressou, não só soube estupefacto, que não matara o rival como o encontrou casado.
O tempo passou, Osório chegou a ser preso, não pelo crime de Santarém, mas por outro cometido em Montevideu — onde o capitão Aguiar o contractara como piloto —
Mas conseguiu fugir da prisão e desaparecer.
Os verdadeiros autores do crime, Miguel Osório e o seu cúmplice Gil Martins, só foram descobertos pelo peso de consciência deste último, na despedida da própria vida. Para trás ficou a morte de dois inocentes, o pintor da Tapada e o proprietário do Cartaxo que passou pelo local da emboscada — pois foi abatido na emboscada armada ao Dr. Constantino — na hora errada.



Porta de Atamarma

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