12 de julho de 2012

CALEIDOSCÓPIO 194

EFEMÉRIDES – Dia 12 de Julho
Gil North (1916 - 1988)
Geoffrey Horne nasce em Skipton Yorkshire, Inglaterra. Diplomata britânico e antropologista escreve 5 romances sob o seu nome, mas utiliza pseudónimo literário Gil North para criar o Sargento Caleb Cluff, um polícia local que protagoniza 11 livros. A série Caleb Cluff inicia-se com Sergeant Cluff Stands Firm em 1960 e termina em 1972 com Sergeant Cluff Rings True. É o próprio autor que em 1964 faz a adaptação televisiva dos seus romances a 20 telefilmes.

Donald E Westlake (1933 – 2008)
Donald Edwin Westlake nasce em Brooklyn, New York, EUA. Na sua autobiografia o autor escreve: “Soube que era escritor quando tinha onze anos; o resto do mundo demorou cerca de dez anos a concordar comigo”. De facto Donald E Westlake começa a escrever muito cedo, ainda na adolescência, mas vê as suas histórias serem recusadas até 1954, altura em que consegue vender o seu primeiro conto. No total, ao longo da sua carreira literária, publica mais de 100 romances, na sua maioria policiários, mas também alguns de ficção científica. É um dos dois escritores que consegue 3 Edgar Awards em 3 categorias diferentes: em 1968, com God Save The Mark para Best Novel; em 1990, com Too Many Crooks para Best Short Story; e em 1991, na categoria de melhor argumento para cinema, com The Grifters. O escritor é também distinguido em 1993 com o cobiçado título de Grand Master atribuído pela Mystery Writers of America. Donald E Westlake usa muitos pseudónimos literários: John B Allen, Richard Stark, Curt Clark, Tucker Coe, Timothy J Culver, J Morgan Cunningham, Samuel Holt, Alan Marshall, Allan Marshall, Edwin West e ainda Sheldon Lord nos trabalhos em co autoria com Lawrence Block. Destaca-se o pseudónimo mais conhecido Richard Stark, sob o qual escreve vários romances de policiário negro; publica 24 livros da série Paker — um ladrão implacável e impiedoso — iniciada em 1962 com The Hunter também com os títulos Point Blank e Payback; É considerada uma das melhores obras do autor, é adaptada ao cinema em 1967 e novamente em 1997. Sob este pseudónimo escreve ainda 4 livros da série Alan Grofield. Em Portugal é possível encontrar o registo dos seguintes livros:

Donald E Westlake
1 – Os Mercenários (19??), Nº3 Colecção Olho De Lince, Editora Portugália. Título Original: The Mercenaries (1960), editado também com o título The Cutie.
2 – 361 (1965), Nº65 Colecção Enigma, Editora Ática. Título Original: 361 (1962).
3 – O Pombo Fugitivo (1965), Nº83 Colecção Enigma, Editora Dêagá. Título Original: The Fugitive Pigeon (1965).
4 – O Homem Oculto (1966), Nº89 Colecção Enigma, Editora Dêagá. Título Original: Pity Him Afeterwards (1964).
5 – Tempo Para Matar (1968), Nº112 Colecção Enigma, Editora Dêagá. Título Original: Killing Time (1961).
6 – Alguém Me Deve Dinheiro (1990), Nº116 Colecção Caminho de Bolso Policial, Editorial Caminho. Título Original: Somebody Owes Me Money (1969).
7 – O Roubo Do Banco (1991), Nº136 Colecção Caminho de Bolso Policial, Editorial Caminho. Título Original: Bank Shot (1972).


Richard Stark
1 – O Caçador de Homens (1964), Nº1 Colecção Rififi, Editora Íbis.
2 – A Estatueta (1965), Nº17 Colecção Rififi, Editora Íbis. Título Original: The Mourner (1963). É o 4º livro da série Parker.
3 – O Homem Do Rosto Escondido (1965), Nº21 Colecção Rififi, Editora Íbis. Título Original: The Man With The Getaway Facet (1963). É o 2º livro da série Parker, editado também com o título The Steel Hit.
4 – A Quadrilha (1965), Nº26 Colecção Rififi, Editora Íbis. Título Original: The Outfit (1963). É o 3º livro da série Parker.
5 – O Abutre (1966), Nº34 Colecção Rififi, Editora Íbis. Título Original: The Jugger (1965). É o 6º livro da série Parker.
6 – Um Milhão De Dólares (1966), Nº49 Colecção Rififi, Editora Íbis. Título Original: The Handle (1966). É o 8º livro da série Parker.
7 – O Bolo (1966), Nº54 Colecção Rififi, Editora Íbis. Título Original: ???
8 – Roubo No Estádio (1967), Nº60 Colecção Rififi, Editora Íbis. Título Original:
9 – O Golpe Das Moedas Raras (1967), Nº74 Colecção Rififi, Editora Íbis. Título Original: The Rare Coin Score (1967). É o 9º livro da série Parker.
10 – A Menina (1967), Nº77 Colecção Rififi, Editora Íbis. Título Original: ???
11 – O Golpe Das Notas De Mil (1968), Nº85 Colecção Rififi, Editora Íbis. Título Original: The Green Eagle Score (1967). É o 10º livro da série Parker.
12 – Uma Rapariga Em Perigo (1969), Nº125 Colecção Enigma, Editora Dêagá. Título Original: The Damsel (1967).
13 – O Traidor (1972), Nº1 Colecção Círculo Negro, Editora Bertrand. Título Original: The Soure Lemon Score (1969). É o 12º livro da série Parker.
14 – Uma Mulher Sozinha (1972), Nº2 Colecção Círculo Negro, Editora Bertrand. Título Original: Deadly Edge (1971). É o 14º livro da série Parker.


TEMA — UM CONTO ESQUECIDO DE MÁRIO DOMINGUES — O DESEJADO
Publicado no Nº75-II Série do Diário de Notícias Ilustrado, de 1929

Haviam encontrado um no outro os seus mútuos ideais realizados. Helena era a mulher que Severo Patrício sonhara: perfeita materialização do provérbio latino — alma sã em corpo são — aperfeiçoado pela graça helénica dos movimentos, pela correcção admirável de seu rosto, onde os olhos prometiam doçuras infinitas e os lábios murmuravam brandas frases cristãs.
Para ela, Severo era o homem equilibrado e perfeito que o seu ideal, levado ao ultimo requinte, tantos vezes desejara: alto, espadaúdo como uma estátua romana, cabelos levemente ondulados engrinaldando uma fronte ampla e altiva, decisivo nas atitudes, claro e sóbrio na palavra e uma chama de veemência, de louco ardor a brilhar-lhe nos olhos escuros.
Tinha ele vinte e cinco anos completos e desde os dezoito que, numa alta compreensão da vida, se cultivava em corpo e em espírito para uma existência superior, nimbada de pureza como a dos santos. Entre estes e Severo havia, porém, uma diferença, fundamental na maneira por que agiam para atingir o mesmo fim altruísta: os santos desprezaram a carne mísera para só em espírito imortal e puro servirem a Humanidade, Severo, como um jardineiro que dia a dia embeleza o seu jardim, cultivava o corpo e a alma para os legar à humanidade sofredora, como luminoso exemplo a seguir.
Ele era, como Helena, um naturista convicto, tinha o culto da beleza e da saúde e não queria que tantos esforços de purificação, que o haviam tornado superior, se perdessem esterilmente no seu túmulo. A sua obra tinha que perdurar num filho, átomo vivo da humanidade, elemento inicial de uma reacção eficaz — mais eficaz do que palavras de discursos — contra os grandes males que a afligiam. Um filho perfeito seria a melhor herança que legaria ao mundo corrompido por mil enfermidades e taras.
Mais que a graça, a frescura a elegância e a sedução personificadas, Severo Patrício viu em Helena, a naturista, a mulher que nunca mordera com seus dentes pequeninos, alvos e certos cadáver de animal, que jamais ingerira excitante capaz de adulterar a beleza de seu pensar ou a pureza de seus sentimentos. Ela era a estátua viva do seu sonho de apóstolo da vida natural.
Enlaçados pelo mesmo amor, pela mesma aspiração de existência imaculada Severo e Helena, caminhando a par pelas áleas verdejantes e sinuosas da quinta dormente onde ele a encontrou, corações abertos à doce melancolia daquele entardecer cismador, construíam em fantasia o lar futuro: ninho de aves ingénuas que vivem da natureza para a natureza, respirando ar puro alimentando-se das delicadas iguarias — comida de anjos — que o reino vegetal ubérrimo oferece ao Homem, colhendo, qual Adão e Eva no Paraíso, os dourados pomos dos frondosos ramos.
E para remate destas belas fantasias, para cúpula daquela catedral de ilusões, Severo, tomando as mãos da rapariga, que ruborizava levemente, falava-lhe no filho, aquele filho que deveria ser a síntese harmoniosa das mútuas perfeições.
No meio naturista de Lisboa, onde Severo habitualmente residia, tomou foros de sensacional a notícia da próxima ligação dos dois jovens. Era um casamento feliz, vaticinava-se. E a propaganda da regeneração humana, pela dieta natural, iria, se o enlace fosse fecundo, tomar uma consistência inabalável, baseada no facto iniludível dos frutos daquele amor bem-aventurado.
Provar-se-ia então, ante a criança maravilhosa que surgiria, que o homem, vivendo uma vida tanto quanto possível aproximada da Natureza, exposta aos raios tonificantes do sol, — a acção purificadora do ar livre, dos alimentos vegetais, da agua refrigerante, seria mais feliz, mais inteligente, mais bondoso e resistente na luta contra a adversidade do que intoxicando-se nos cinemas, nos cafés e nos teatros e absorvendo, longe da atmosfera das praias e dos campos, iguarias complicadas feitas de cadáveres de animais sacrificados à sua voracidade.
A grande festa de núpcias efectuou-se, por uma soalheira tarde de estio, em uma quintarola dos arredores de Lisboa, onde os noivos ficariam vivendo os seus dias felizes. Acorreu ali tudo o que havia de melhor no meio naturista: vegetarianos fanáticos, que pregam na praça pública, vestidos de branco, barbas longas e cabeleiras revoltas ao vento, a regeneração da humanidade, pela absorção do nabo, a redenção de todos os crimes, pela salada de rabanetes; idealistas estranhos de olhos abertos que, interpretando a seu modo teorias filosóficas, falavam com elementaes e aspiravam a suprema perfeição no plano astral; médicos excêntricos formados por vagas Universidades de Trofologia de países distantes; raparigas espíritas que, embora pensando muito nos mestres Carton e Allan Kardec, não deixavam de manter conversa animada em voz baixa com certo pastor protestante, de olhar pudico, que lhes falava de amor. Todos eles, unidos pelo mesmo ideal — o vegetarianismo — ergueram hinos de felicitação aos noivos, que suspiravam de alívio o clássico “enfim sós”, quando os viram pelas costas, com as suas barbas brancas, as suas cabeleiras, as suas teorias estranhas e a sua algazarra.
Começaram então a viver a sua vida perene de venturas. O que naquela tarde cismadora, namorados ainda, haviam fantasiado docemente, materializava-se, dia a dia, sem que entre eles surgisse sequer a sombra de um amuo. Não havia, decerto no mundo, dois pares tão felizes como aquele. E para cúmulo, ao cabo de pouco tempo de deliciosa vida em comum, Helena, uma manhã, chegando-se muito ao peito do marido e ruborizada até as orelhas murmurou-lhe envergonhada um segredo. Ia ser mãe.
Decorreram meses em grande ansiedade. Ainda a criança não surgira à luz radiosa do dia já os pais não pensavam, não viviam senão para ela. Redobraram em casa os cuidados higiénicos, e a dieta vegetariana, se fosse possível, seria mais rigorosamente praticada.
Quando a data do desenlace se aproximou mais frequentes e assíduas se tornaram as visitas dos naturistas, que acudiam de Lisboa ansiosos por levar á Associação Vegetariana a grande notícia. E um dia um velho naturista misantropo deu a novidade, em poucas e sábias palavras:
— Nasceu um monstro.


TEMA — LITERATURA POLICIÁRIA PORTUGUESA — REPRESENTAÇÃO DO MAL
Texto transcrito de Na Sombra e No Silêncio de W. Strong Ross, autor policiário português.

O mau… do mal que se pratica, reside nessa estranha afinidade (nas consequências intercomunicantes) que existe nas coisas más: umas, bradam pelas outras, atraindo-as. O mal, por lógica, nunca pode realizar o bem e, se o realiza, é porque era um falso mal, porque era um bem, embora com aparência de mal. Porém, a realidade comum é o mal atrair o mal, gerar o mal. Quem planta a cicuta, só colherá o veneno.
A perpétua história da vida universal, desde o surgir da estrela de primeira grandeza até ao desaparecimento do colibacilo, desde o esplendor do nascer do Sol até ao tenebror da profunda noite… só é escrita em duas páginas: a do bem e a do mal. Nelas cabem todas as oscilações existenciais do porquê e do para quê dos aconteceres, todas as eternas lutas entre as expressividades da felicidade e da desgraça humanas, entre a vida e a morte das coisas. O resto, isto é, a alegria e a tristeza do ser animal, o belo e o feio das coisas, o útil e o inútil dos factos… são meras e transitórias consequências das duas páginas — síntese: bem e mal. O facto neutro não tem história.
Assim se quer dizer — confinando-nos na análise a uma circunstância restrita — que um criminoso é sempre uma representação do mal… Mal que nele está, dele parte, e para ele volta. E felizmente que se dá este fenómeno de retorno, este ricochete do mal, porque de contrário, sem temor dele, a vida humana reduzir-se-ia a uma vivência muito mais efémera, a um cúmulo de crimes, dores e mortes prematuras. Sem responsabilidade pelos actos, só haveria uma lei e uma justiça: as do poder físico! Como as feras… Mas mais injustas e cruéis, porque a inteligência humana lhes daria a perversidade…

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