25 de abril de 2012

CALEIDOSCÓPIO 116

EFEMÉRIDES – Dia 25 de Abril
Michael Harrison (1907 – 1991)
Maurice Desmond Rohan nasce em Milton, Kent, Inglaterra. Jornalista, editor, consultor e escritor de ficção científica, fantasia e policiário usa vários pseudónimos literários. Assina a maior parte das suas obras como Michael Harrison. Na década de 50 é considerado um especialista em Sherlock Holmes, tendo publicado 32 livros de não ficção sobre História, Londres, Sherlock Holmes como por exemplo In the Footsteps of Sherlock Holmes (1960). Escreve 18 romances policiários e ficção científica e 1 colectânea de contos policiários The Exploits of Chevalier Dupin também editado com o título Murder In The Rue Royale (1968). Sob o pseudónimo Quentin Downes escreve 4 livros protagonizados pelo Inspector Abraham Kozminski
Utiliza apenas uma vez o pseudónimo Michael Egremont em Bride of Frankenstein (1936).

Richard Deming (1915-1983)
Nasce em Des Moines, Iowa, EUA. Inicia-se na escrita policiária em 1942 com The Gallows in My Garden , o primeiro livro da série Manville (Manny) Moon. Cria ainda as séries Dragnet, Matt Rudd e Mod Squad. No total escreve perto de meia centena de livros policiários e alguns contos, como Richard Deming ou sob os pseudónimos Emily Moor, Halsey Clark, Lee Davis Willoughby, Max Franklin, Nick Morino e Richard Hale Curtis.


TEMA — SONHO E POESIA — ALEGRIA É VÉSPERA DA DOR
De Fausto Pereira Leal in Célula Cinzenta
Alegria é véspera da dor…
Embarca-se para dentro
Numa transfiguração
Fecundada pelo tempo
Um novo céu
É como olhos de fogo…
Uma nova terra
É como olhos de carne…
O ritual do laço permanece
Tanto na luz que acende
Como num caminho escuro…
Omnipresente, meu cravo de carne
Assobia à chuva…
A canção esquimó
É cântico maravilhoso
No fim do mundo…
Porquê mitos e mistério
Na existência do dia a dia?…
Porquê proclamar um novo céu
Num linguajar fecundo? …
Há sempre folhas a cair…


TEMA — CONTO POLICIÁRIO — UM PORMENOR PRECIOSO
De Domingos Cabral

“O Crime não compensa… O Crime não compensa… O Crime não compensa…”
Como uma obsessão, como se fora um martelar contínuo, a frase continuava a assaltar-lhe a mente, a subjugá-lo, a aniquilá-lo. Quis expulsá-la. Pensar noutra coisa. Mas a voz grave do Juiz, quando uma semana atrás lera a sentença no seu julgamento, continuava a massacrá-lo com todo o peso e a dureza que agora bem profundamente compreendia:
— “… e espera a justiça, que este Tribunal aqui representa, que a pena a que acaba de ser sentenciado lhe proporcione a oportunidade de meditar no seu tão condenável acto, permitindo-lhe o arrependimento sincero e a sua recuperação como Homem, como elemento útil e válido para uma Sociedade mais justa e fraterna, através da conclusão, a que decerto chegará, de que O Crime não compensa…”
O Crime não compensa! Não compensa, realmente, pensou com amargura. Vinte anos, vinte anos de prisão maior eram bem a insofismável prova disso!
Parte duma vida humana, não vivida, subtraída assim a uma existência que tão profundamente ficará marcada por tão dura quão lamentável provação.
Fora grande o ódio que dedicara àquele que foi a sua vítima, e que ele acreditou, num inexplicável momento de falta de serenidade e consciente reflexão, que podia suprimir sem consequências graves para si — pensou, enclavinhando as mãos, fortemente, nas duras e frias grades que defendiam agora o seu cativeiro.
Enganara-se. Enganara-se profundamente, via-o bem agora. E quão arrependido estava! Acreditara que podia cometer o crime, ver-se livre daquela obsessão odiosa, e ficar impune, beneficiando da presença, próxima, de outras duas pessoas. Pessoas que seriam tão suspeitas como ele, não permitindo à Justiça uma solução satisfatória, por falta de concretos elementos de prova, que ele não deixara. E como não houvera testemunhas.
Acreditara-o firmemente, pois desferira o golpe com rapidez, fora das vistas de alguém, a vítima expirara logo, sem possibilidades de deixar qualquer indício acusatório para si, e imediatamente ele dera prosseguimento ao seu álibi metendo-se na arrecadação onde se encontrava o telefone, a pretexto de efectuar uma chamada telefónica, conforme já antes, ostensiva e intencionalmente, anunciara. Precisamente para justificar, ali, a sua presença durante o tempo em que o crime fosse praticado, construindo assim o álibi de que necessitava para a sua impunidade.
Rememorou aqueles momentos trágicos que tão dolorosos lhe eram já.
Entrara na arrecadação-cabine, simulando efectuar uma chamada que efectivamente não fez, aguardara que a sua vítima ficasse só — o que acontecera quase de imediato à sua entrada, porquanto um dos presentes fora para o WC e a outra para a cozinha —, saiu, cometeu o crime servindo-se para isso de uma faca que, conjuntamente com outros talheres se encontravam, em desordem sobre o balcão, e voltou à arrecadação, onde se deixou ficar até o corpo ser descoberto. O que não demoraria, evidentemente, pois nem a estadia de um, na casa de banho, poderia ser muito longa, nem a outra, certamente, estaria também muito tempo sem vir buscar os pratos, chávenas, copos e talheres que sobre o balcão aguardavam lavagem, pois que fora com essa finalidade que se dirigira à cozinha. O corpo seria então descoberto e, certamente, ante as negativas de todos e a falta de provas incriminativas para qualquer deles, o crime acabaria por ser atribuído a qualquer pessoa, vinda do exterior, e que para ali de novo rapidamente se dirigira após a perpetração do acto. Tudo perfeito, tudo rápido, tudo lógico, pensava, mas…
…Mas, embotado como estava o seu espírito, não viu os erros que subjacentes a esta actuação, a este plano, existiam a incriminá-lo de forma inapelável. Os criminosos esquecem-no sempre, mas sempre as circunstâncias levam a justiça a demonstrar que O Crime Não Compensa. Sempre!
Às vezes pequenos nadas, mas sempre suficientes. Como no meu caso: pois não esquecera ele, na sua precipitação, que se tivesse e efectivamente e editado uma chamada telefónica de dois minutos, com a qual supunha ter construído o seu álibi, o fiscalizador de chamadas situado numa das prateleiras do balcão, forçosamente assinalaria os períodos — impulsos — correspondentes ao tempo de conversação?
Sim, lamentavelmente esquecera isso — evocava dolorosamente, fincando as unhas nas grades. E quando vira o Inspector, depois de fazer ele próprio uma chamada, “olhar lentamente à roda da sala” e ir verificar o contador, compreendera, de repente, o seu tremendo erro. Sentira-se então aturdido, confuso, quase perdido. Afinal um erro ião estúpido…
Tentara, ainda, titubear uma explicação, conseguir anular, de qualquer forma, o que pensava ainda ser o seu único erro. Tinha que consegui-lo, estava em jogo a sua liberdade, a sua vida…
Mas já o Inspector, sem lhe dar tempo a raciocinar, arguto e rotinado nestas situações, continuava a sua acusação:
— “… a sua pretensa chamada, como o comprova a ausência de impulsos no fiscalizador respectivo, que só assinala os da curta chamada que eu há pouco  efectuei, não foi mais do que um bluff para conseguir um álibi.”
Quisera, aqui, argumentar, dizer algo, protestar, mas as palavras, perante a evidência fria da realidade, custavam a sair-lhe e, de resto, o Inspector, implacável continuava já a sua acusação:
— De resto, não foi este o único erro que o senhor cometeu…
Quê, pois seria possível? Haveria realmente mais erros? — interrogou-se, absolutamente descontrolado, sem capacidade já para qualquer raciocínio sereno e correcto.
— Realmente, como explica o senhor ter conseguido, com o rádio funcionando tão alto, falar ao telefone calmamente com o seu amigo, durante dois minutos, como afirmou, se eu próprio, há pouco, tive dificuldade em fazê-lo, numa chamada mais breve? Como explica tal facto, estando para mais o rádio aqui tão próximo da arrecadação, quando, mais longe, na cozinha, a empregada que lavava a loiça, apesar do característico barulho desta actividade ouvia distintamente a música?
E porque se encontrava a porta da arrecadação fechada — um pormenor curioso que me chamou a atenção quando para ela entrei — se, precipitadamente, ao ouvir o grito, como afirma, o senhor veio logo ver o que se tinha passado?
Não vale a pena negar, como vê, mas, se não quiser admitir a sua evidente participação no caso, que é evidente, e eventualmente manter a versão de que falava com um amigo, importa-se de me dar a indicação desse amigo, para que possamos fazer a devida confirmação?
Era o fim, o ruir da história arquitectada, a derrota.
Sentira-se destroçado, desorientado, sem saber o que dizer e fazer. Não imaginara, nunca, que o Inspector - que em tão má hora logo ali aparecera, coisas do destino! — pudesse descobrir como, e tão rapidamente, o caso se passara.
Baixara a cabeça, desalentado, numa evidente confissão de culpa…
Seguiram-se os intermináveis dias de cárcere, aguardando o julgamento, com toda aquela dolorosa expectativa que o roía por dentro, o mortificava, aquela agonia que o subjugava' numa ânsia atroz.
E agora…
…vinte anos! Tanto tempo!
E os dias longos, longos, longos... E aquele arrependimento, aquele remorso que já o dominava, a lembrança do mundo exterior, a família… A FAMÍLIA…
Vinte anos! E a pena ainda só começava a ser cumprida!
Vinte anos… Cumpri-la-ia? Não endoideceria antes? Não morreria? Conseguiria aguentar tão grande e difícil provação? E que homem seria, o que lhe restaria para viver e como, depois de tudo isto?
Aniquilado, a cabeça baixou-lhe, como naquele outro momento crítico, enquanto as lágrimas começavam a correr-lhe e, de novo, soava bem alto dentro de si: o crime não compensa…
O CRIME NÃO COMPENSA… O CRIME NÃO COMPENSA...

Comentário
O autor do presente conto, Domingos Cabral, o Zé dos Anzóis ou Inspector Aranha não é um contista; o seu talento sobejamente demonstrado, reflecte-se na actividade de solucionista policiário, modalidade em que é um interventor consagrado, um campeão nacional com uma sala recheada de prémios e títulos. Dele conhecemos, temos essa honra, reconhecidos méritos, um homem de recursos extraordinários. Quis ser seccionista e dirige presentemente a sua quarta secção o Correio Policial no semanário regional Correio do Ribatejo; quis escrever um enigma policiário e ei-lo publicado no Público Policiário, género-tipo criptograma, a atrapalhar muitos concorrentes para encontrar a solução… a mais recente obra, — diz-se — é que é um avô babado!
M. Constantino

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